AMIGO FIEL |
Em uma de minhas viagens de férias estive em
minha terra natal, São João Nepomuceno, em Minas Gerais. Desta vez visitei a cidade como turista e
resolvi fotografar paisagens e detalhes especiais característicos das terras de
Minas.
Visitando a casa de uma prima que tem aos
fundos o cemitério da cidade, resolvi olhar as sepulturas dos familiares que
ali se encontravam. Para não dar uma volta muito longa, encurtamos o caminho
passando por baixo de uma cerca de arame farpado, pois o cemitério não tinha
muros naquele local.
Meu primo foi comigo mostrando algumas
sepulturas e contando histórias interessantes sobre seus “moradores”. Passamos ali alguns momentos e foi bastante interessante.
Quando estávamos voltando para casa, vi ao
longe alguma coisa parecida com um cachorro e fui verificar de perto. Era mesmo
um cão, ou melhor, uma estátua de um cão deitado. O sol estava muito claro
naquela hora da tarde, e meus olhos doíam com a claridade da estátua branca.
Quis saber o motivo da presença da estátua junto a uma sepultura muito antiga. E foi esta a história que meu primo contou.
Havia na cidade um homem, Miguel, que tinha um
cachorro que o acompanhava por todo o lugar em que ia. Mesmo quando saía a cavalo
para locais mais distantes, o cachorro ia junto obrigando-o a parar para que o
amigo pudesse descansar e alimentar-se. Ao dormir, o cão montava guarda aos pés
de sua cama. Ao trabalhar, o cão estava junto, deitado a alguns passos de seu
dono caso ele precisasse de seus serviços.
E assim foi por muitos anos. Sempre fiel, sempre companheiro. Homem e cão inseparáveis.
Porém, Miguel adoeceu gravemente e durante todo
o tempo o cão ficou ao seu lado no quarto. Depois de alguns meses, no dia 8 de
maio de 1926 Miguel faleceu. Durante o velório, que naquela época era feito na
casa da família, o cão ficou deitado embaixo da mesa onde estava apoiado o
caixão. Era uma tristeza só.
Em cidades pequenas o cortejo fúnebre é feito a
pé. O caixão é depositado num carrinho que vai sendo empurrado pelas ruas da
cidade. À medida que o cortejo vai passando, as casas comerciais vão cerrando
suas portas em sinal de respeito, abrindo-as só depois da passagem da
procissão.
Não foi diferente naquele dia. Todos os amigos
e familiares acompanhavam o caixão em uma fila silenciosa. Ao lado do carrinho
ia o cão, cabisbaixo e também silencioso. Ele acompanhou toda a cerimônia de
despedida sentado ao lado da sepultura. Todos voltaram para casa, mas ele
permaneceu deitado ao lado de seu dono como sempre fizera.
Passados os dias, as pessoas perceberam que ele
não voltava para casa. Bebia água dos vasinhos de flores e não se alimentava. A
família foi avisada. Tentaram levar o cão, mas ele se recusava a ir, e mesmo
quando forçado, na primeira oportunidade voltou para montar guarda ao seu dono.
Os familiares entenderam que ele não sairia
mais dali e então passaram a levar-lhe água e alimento. Assim foi por mais
alguns anos. Providenciaram um abrigo para ele ao lado da sepultura. E ele,
fielmente guardando seu amigo. Todos o conheciam. Era motivo de muitas visitas
ao túmulo de Miguel.
O cão foi envelhecendo e chegou seu dia de
partir. Deitou em cima da sepultura de seu amigo e ali morreu. Os familiares,
em homenagem a tão fiel amigo fizeram uma estátua do cão e a colocaram junto ao
túmulo da família com o epitáfio: “DORME QUE EU VELO”.
Ninguém soube informar o nome do cão; mas isso
não tem importância. O importante é o legado de fidelidade e amor incondicional
demonstrados por esse animal tantas vezes injustiçado, abandonado e judiado.
Podem existir amigos verdadeiros, mas nenhum capaz de tanta dedicação e amor
como um cão.