Chovia muito. Era um domingo já anoitecendo. Ao lado
de nossa casa havia um terreno vazio cercado de muros altos e um portão de
ferro. Ouvimos muito longe, misturados ao barulho da chuva, miados de filhotes
de gato. Apurando os ouvidos, percebemos que vinham do terreno ao lado. Nosso
filho caçula desesperou-se e queria subir no muro e resgatar os bichinhos; com
receio de que o muro caísse, pois estava com uma enorme rachadura e muito
molhado, não o deixamos subir.
Na manhã de
segunda-feira Rafael foi o primeiro a sair de casa, e ao chegar na calçada viu três filhotinhos de
gato arrastando-se para fora do portão do terreno. Com sua alma de São
Francisco de Assis, recolheu os filhotes e foi procurar quem pudesse adotá-los.
Na padaria
próxima conseguiu deixar dois deles e o que sobrou levou para casa. Estávamos
todos de saída para a escola e trabalho; o bichinho miava desesperado de fome,
frio e medo. Coloquei-o numa caixa de sapatos forrada com alguns panos para se
aquecer. Não acreditava que fosse encontrá-lo vivo quando voltássemos.
Pouco depois
do meio-dia chegamos todos para o almoço e lá estava o filhote miando sem
parar. Um dos meninos foi à farmácia comprar uma mamadeira pequena, mas o bico
era do tamanho da cabeça do bichinho. Sua boquinha minúscula era incapaz de
pegar o bico da mamadeira. Então tivemos a ideia de colocá-lo na palma da mão e
íamos apertando o bico e o leite saía num esguicho que o gatinho bebia
sofregamente.
Ligamos para
uma amiga veterinária que foi examinar a criaturinha – era uma fêmea mestiça de
siamês. Ela nos orientou quanto aos cuidados necessários e depois de alguns
dias ela, que recebeu o nome de Nikita, abriu os olhos que eram muito azuis.
Como era feia! Só tinha olhos e orelhas. Não tinha quase pelos, e era cor-de-rosa.
Bem alimentada
e amada por todos, foi crescendo e não miava mais. Quando queria alguma coisa,
emitia apenas um miado rápido e nos olhava com aqueles olhos enormes. Aprendeu
mamar sozinha. Quando batia a fome, pedia a mamadeira, pulava na caixa de
sapatos e ficava com as quatro patinhas
para cima esperando. Segurava a mamadeira e sorvia todo o leite. Ao terminar,
chutava para longe e saía da caixa toda satisfeita.
Foi crescendo,
mas continuava feinha e esquisita. Ao sentir frio, escalava as pernas do meu
marido e entrava no bolso de sua camisa. Enquanto ele trabalhava, ela ficava lá
dormindo. À noite ele ia me buscar na faculdade e ela ia junto equilibrando-se
no painel do carro ou encosto do banco. Quando eu entrava ela pulava para o
alto da minha cabeça e ia se equilibrando. As pessoas achavam que ela era um
miquinho. Era hilária!
Nikita ficou
adulta e menos feia. Era o dengo da família. Nós vigiávamos para que ela não
saísse de casa, pois morávamos num local muito movimentado de carros, ônibus e
caminhões. Ela entrou no cio e não teve jeito. Fugiu pela janela da cozinha e
acabou cruzando com um lindo gato rajado. Teve três filhotes rajados de preto e
cinza com os olhos azuis. Eram lindos. Dois foram adotados, um ficou conosco, e
esperando que ele também encontrasse um lar, o chamávamos de Pequeno. O tempo
passou e ele acabou ficando. Mas essa é outra história.
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