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quinta-feira, 24 de janeiro de 2019

NIKITA



Chovia  muito. Era um domingo já anoitecendo. Ao lado de nossa casa havia um terreno vazio cercado de muros altos e um portão de ferro. Ouvimos muito longe, misturados ao barulho da chuva, miados de filhotes de gato. Apurando os ouvidos, percebemos que vinham do terreno ao lado. Nosso filho caçula desesperou-se e queria subir no muro e resgatar os bichinhos; com receio de que o muro caísse, pois estava com uma enorme rachadura e muito molhado, não o deixamos subir.
Na manhã de segunda-feira Rafael foi o primeiro a sair de casa,  e ao chegar na calçada viu três filhotinhos de gato arrastando-se para fora do portão do terreno. Com sua alma de São Francisco de Assis, recolheu os filhotes e foi procurar quem pudesse adotá-los.
Na padaria próxima conseguiu deixar dois deles e o que sobrou levou para casa. Estávamos todos de saída para a escola e trabalho; o bichinho miava desesperado de fome, frio e medo. Coloquei-o numa caixa de sapatos forrada com alguns panos para se aquecer. Não acreditava que fosse encontrá-lo vivo quando voltássemos.
Pouco depois do meio-dia chegamos todos para o almoço e lá estava o filhote miando sem parar. Um dos meninos foi à farmácia comprar uma mamadeira pequena, mas o bico era do tamanho da cabeça do bichinho. Sua boquinha minúscula era incapaz de pegar o bico da mamadeira. Então tivemos a ideia de colocá-lo na palma da mão e íamos apertando o bico e o leite saía num esguicho que o gatinho bebia sofregamente.
Ligamos para uma amiga veterinária que foi examinar a criaturinha – era uma fêmea mestiça de siamês. Ela nos orientou quanto aos cuidados necessários e depois de alguns dias ela, que recebeu o nome de Nikita, abriu os olhos que eram muito azuis. Como era feia! Só tinha olhos e orelhas. Não tinha quase pelos, e era cor-de-rosa.
Bem alimentada e amada por todos, foi crescendo e não miava mais. Quando queria alguma coisa, emitia apenas um miado rápido e nos olhava com aqueles olhos enormes. Aprendeu mamar sozinha. Quando batia a fome, pedia a mamadeira, pulava na caixa de sapatos e  ficava com as quatro patinhas para cima esperando. Segurava a mamadeira e sorvia todo o leite. Ao terminar, chutava para longe e saía da caixa toda satisfeita.
Foi crescendo, mas continuava feinha e esquisita. Ao sentir frio, escalava as pernas do meu marido e entrava no bolso de sua camisa. Enquanto ele trabalhava, ela ficava lá dormindo. À noite ele ia me buscar na faculdade e ela ia junto equilibrando-se no painel do carro ou encosto do banco. Quando eu entrava ela pulava para o alto da minha cabeça e ia se equilibrando. As pessoas achavam que ela era um miquinho. Era hilária!
Nikita ficou adulta e menos feia. Era o dengo da família. Nós vigiávamos para que ela não saísse de casa, pois morávamos num local muito movimentado de carros, ônibus e caminhões. Ela entrou no cio e não teve jeito. Fugiu pela janela da cozinha e acabou cruzando com um lindo gato rajado. Teve três filhotes rajados de preto e cinza com os olhos azuis. Eram lindos. Dois foram adotados, um ficou conosco, e esperando que ele também encontrasse um lar, o chamávamos de Pequeno. O tempo passou e ele acabou ficando. Mas essa é outra história.

A VIDA É BELA


Reflexão para o dia de hoje - Sustentados